O Inventor do Walkman


O Walkman é uma espécie de bisavô dos dispositivos de mp3 player. Embora seja muito óbvio que hoje em dia qualquer smartphone possa armazenar e tocar arquivos de músicas a coisa não era exatamente assim antigamente.

A invenção do Walkman consistiu na possibilidade de ouvir música de modo privado. Foi a capacidade de restringir os limites do som aos limites de um ouvinte apenas. O Walkman individualizou a propagação do som e com isso ofereceu ao ouvinte liberdade, comodidade e privacidade.

Muitas são as histórias admitidas a respeito do surgimento do Walkman, mas nenhuma delas nos serve aqui. Quero continuar com a história de Louis Wolfson, o esquizofrênico de New York.
Reza a lenda que Wolfson construiu o primeiro protótipo de Walkman ao juntar um estetoscópio a um aparelho de gravação e reprodução de fitas. Até aí não há nada de absurdo. O interessante mesmo reside no princípio que motivou Wolfson a fazer isso com frequência. Tratava-se para ele de criar uma barreira entre ele mesmo e a sua língua materna. Wolfson era esquizofrênico e não podia suportar ouvir a sua lingua de origem. Era como se cada palavra pudesse furar seus tímpanos. Ao usar o estetoscópio ele criava uma barreira sonora em relação ao mundo ao redor e as pessoas que falavam o idioma de origem.

Fato engraçado este que me ocorre. Não é exatamente para isso que muitas pessoas usam fones de ouvido em cada esquina, coletivos e nos demais espaços públicos? Não é por uma recusa a tudo que vem de fora que aumentamos o volume na tentativa de suprimir cada barulho emitido pelo ao redor? Não é sobretudo por uma recusa momentânea do outro, das suas palavras e do seu jeito de falar que tampamos os ouvidos com os headphones? O princípio do Walkman é um princípio ironicamente esquizofrênico. Mas eu não falo da esquizofrenia em seu sentido estritamente clássico. A maior loucura do nosso tempo não é simplesmente o egoísmo,  mas a recusa total do outro ou a intolerância do mesmo. Ou é isto ou o esgotamento da vida cotidiana e o ininterrupto hábito de publicização de si mesmo tem feito a alma da gente clamar por minutos de contato consigo. Barulho pra não ouvir o que vem de fora, barulho pra não sair o que vem de dentro.  Nós vivemos soterrados sob toneladas de barulho. A poluição sonora é aquela que não admite o silêncio. No silêncio a gente se escuta. E quando a gente se escuta, a gente escuta o outro.
Neemyas Dos Santos

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Neemyas Dos Santos
Um pecador salvo pela graça de Deus, marido da Lívia, uma mulher cuja alma é semelhante a um carvalho. Psicólogo e Mestre em Psicologia. Atua como Psicólogo Clínico da Universidade Federal do Maranhão.